A recente decisão do Congresso Nacional de rejeitar a maioria dos vetos presidenciais e pôr em vigor o texto original da Lei Geral do Licenciamento Ambiental (LGLA) acendeu um debate intenso — sobretudo nas regiões amazônicas. Para a Federação das Indústrias do Estado do Pará (FIEPA), trata-se de um avanço essencial para destravar investimentos e garantir segurança jurídica. Mas para entidades socioambientais e indígenas, representa um retrocesso que pode agravar desmatamento, conflitos territoriais e ameaças a biomas e comunidades tradicionais.
Em nota oficial, a FIEPA defende que a atualização da lei corrige distorções históricas do licenciamento no Brasil e introduz regras modernas — mais claras, coerentes e previsíveis. A entidade afirma que a nova legislação permitirá destravar “investimentos estruturantes” sem abrir mão da segurança jurídica.
Segundo a nota, a mudança não significa flexibilizar de forma irresponsável os requisitos ambientais, mas oferecer um arcabouço técnico para que os órgãos ambientais possam modernizar práticas internas e concentrar esforços em fiscalização, monitoramento e decisões fundamentadas — em vez de ficar atolados em burocracia.
Para a FIEPA, a lei é uma ferramenta para conciliar o “compromisso com o crescimento” do Pará e da Amazônia com a proteção do patrimônio natural.
A LGLA uniformiza regras de licenciamento em todo o país — simplificando processos que antes variavam conforme estados e municípios.
A modalidade de Licença Ambiental por Adesão e Compromisso (LAC) fica regulada em âmbito federal e pode ser usada para empreendimentos de baixo ou médio impacto, com autodeclaração do empreendedor.
A lei também prevê a possibilidade de uma Licença Ambiental Especial (LAE), permitindo um rito simplificado para empreendimentos considerados “estratégicos”.
Para atividades como agricultura e pecuária de pequeno porte, a lei traz critérios de dispensa de licenciamento, desde que atendidas determinadas condições de regularidade fundiária e supressão de vegetação.
Segundo os defensores da lei, essas mudanças reduzem a morosidade histórica dos licenciamentos — que frequentemente travavam obras e investimentos no país.
Para organizações ambientais e de direitos humanos, o novo marco legal representa um dos maiores retrocessos socioambientais dos últimos anos. A Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) classificou a derrubada dos vetos como “uma derrota histórica para o povo brasileiro”. Em nota, alertou que a mudança reduz a capacidade do Estado de prevenir e controlar danos ambientais — com risco a água, florestas e segurança alimentar.
Críticos apontam que a adoção em larga escala da LAC — com autodeclaração — fragiliza a exigência de estudos de impacto ambientais (EIA/RIMA), abole a necessidade de parecer técnico em muitos casos e reduz drasticamente a participação de órgãos ambientais e da sociedade civil.
Também há preocupação com a vulnerabilidade de povos indígenas e comunidades quilombolas, cujos territórios podem ser afetados sem consulta prévia ou consentimento informado — o que contraria tratados internacionais assinados pelo Brasil.
Um dos argumentos mais críticos diz respeito à imposição de prazos e à flexibilização de procedimentos: para ambientalistas, isso poderá tornar as decisões precipitadas, com alto risco de degradação, especialmente em biomas sensíveis como a Amazônia.
No Pará — onde os setores de mineração, agronegócio e infraestrutura têm forte presença — a nova lei poderá significar, para o setor produtivo, um impulso significativo nos investimentos. A FIEPA aposta que traz agilidade e segurança para obras que hoje estão travadas por burocracia.
Mas o receio cresce entre ambientalistas, indígenas e comunidades tradicionais da região: flexibilizar o licenciamento pode desencadear desmatamento, degradação de rios, ameaças a territórios comunitários e perdas irreversíveis à biodiversidade.
Organizações como o IPAM alertam que, mesmo com o novo marco, é fundamental haver fiscalização, monitoramento efetivo e participação social — sem isso, a lei corre o risco de se tornar “empurrar o Brasil para o retrocesso”.
A nova LGLA cria o arcabouço legal que preza pela padronização e agilidade no licenciamento. Mas o real teste estará na aplicação — especialmente no Norte do país. A lei pode se tornar uma ferramenta poderosa para o desenvolvimento, ou, em falta de fiscalização e responsabilidade, ser o gatilho de mais devastação.
Para fazer valer a promessa de conciliar crescimento e preservação, será preciso enfrentar desafios concretos: garantir que licenças sejam concedidas com rigor técnico, que a participação da sociedade e de povos tradicionais seja respeitada, e que órgãos ambientais tenham estrutura e independência para atuar com eficiência.
No Pará e em toda a Amazônia, o tempo urge — e o futuro dependerá da escolha entre um licenciamento consciente ou uma corrida por lucro sem limites.